sábado, 8 de dezembro de 2007

A mensagem perdida


Arrancaram uma folha ao livro do tempo, e eis que era insubstituível, capital! Em vão procurei de quatro patas, como um bibliófilo, rosnando e farejando por baixo dos móveis. Ó lombadas implacáveis!
Uma traça visitou-me em sonhos; e do alto do cartapácio vomitou toda a página devorada, em tom cínico de speaker. Meu ouvido funcionava como um disco, e cada palavra era um fulgor indelével, uma verdade capital! Batia palmas e palmas, com medo de chorar. A página perdida e para sempre achada, a mensagem telegráfica do Eterno a si mesmo, era simples como um tópico de jornal. Ó sublime reportagem, pensava, ao regressar à minha pele, contarei tudo, tintim por tintim.
Mas no regresso ao vale da cama, - o bombardeiro deixava cair uma a uma as grandes rosas desfolhadas – partiu-se o fio da evidência, e as palavras rolaram pelo chão como as contas de um colar...
Desde então, tenho compulsado os grossos tomos carunchosos, percorrendo o índice com uma paciência de maníaco. Sabe lá... entre uma folha e outra folha, no papel sujo e roído, brilhará um dia a palavra que espero há tantos anos, desde os meus livros cartonados, na escola.

Augusto Meyer, Poesias (1922-1953), Livraria São José, Rio de Janeiro, 1957




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